Finalmente ontem à noite fui assistir "Diários de Motocicleta".
Última sessão, noite seca e fria, boa companhia, cinema lotado, um cafezinho numa livraria antes da sessão, um puxão pelo braço pra ser arrancada da livraria (sempre acontece isso, rss) e finalmente o filme.
A história todo mundo a essa altura já sabe: em 1952, dois jovens argentinos, Ernesto Guevara e Alberto Granado decidem fazer uma viagem, usando uma velha motocicleta Norton 500 - apelidada de "La Poderosa" - para percorrer cerca de 12 mil quilômetros, em nove meses, do sul da Argentina ao norte da Venezuela, passando pelo Chile e Peru. Através desta viagem, eles vão conhecendo as realidades sociais e políticas dos países.
Mas o filme é muito mais do que isso. Sabe aqueles filmes que logo no início roubam sua atenção totalmente? Iniciado o filme, olhos vidrados, nada me incomodava, nem o papel da bala, a pipoca, os cochichos, nada, era eu e eles, só.
Não sei se alguém é assim, mas mesmo quando estou assistindo a um filme, penso muito durante a exibição. Cada cena, imagem, diálogo, vai sendo registrado e ao mesmo tempo fico pensando nos fios que a trama tece.
Quando eles pegam a moto pensei: o que existe de mais libertário do que o vento na cara, o ato despojado de estar em cima de uma moto em contato direto com a natureza, com o tempo, desprotegido de tudo, livre. Eu sei, eu sei que era o veículo que eles tinham, mas como nada é por acaso e tudo tem um sentido que vai além, a moto é sim uma metáfora, no meu entender.
Os críticos viram em determinadas cenas, um tom apelativo propício para um vale de lágrimas. Ora, com licença poética, que tom apelativo? Onde foi que se pesou na mão com intenção explícita de fazer chorar? Nada ali esta fora do lugar. No filme Ernesto era o rascunho do que viria a se tornar, tinha caráter, sinceridade e sobretudo idealismo. Ele acreditava. Essa viagem sem que o soubesse seria o estofo necessário para fazer dele o que se tornou.
A fotografia de Eric Gautier, é deslumbrante, enche os olhos, é poética, vai do colorido ao preto e branco na medida exata que o tom deve ter. Outro detalhe técnico, que se configura em uma linguagem fotográfica interessante, é que o filme foi rodado em Super 16mm, sendo que a película padrão, 35mm, só foi utilizada durante as cenas noturnas.
Fim da sessão, quase meia-noite, estacionamento, o carro. Do lado um cara sobe numa moto e sai e eu pensei, nunca como agora tive tanta vontade de estar ali em cima, sem capacete, sentir quando a força do vento extrai lágrimas dos olhos e ela rola pela face voando na noite, excelente desculpa para chorar.
Enfim, Diários de Motocicleta é poesia pura e quando Alberto Granado aparece no final olhando o avião partir, seus olhos parecem dizer: Acreditem, eu realmente estive lá.
Alberto Granado
Leia: http://www.motorcyclediaries.net/html/granadoInterview.html
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