A escritora, nascida no Rio de Janeiro em 7 de novembro de 1901, foi criada pela avó materna após ficar órfã de pai e mãe. Formou-se professora primária aos 16 anos e aos 18 publicou seu primeiro livro de poemas, "Espectros". Foi menina solitária e quando reclamavam de seu isolamento dizia que sentia não poder desfrutar da companhia de muitas pessoas, realmente preciosas, numa alusão a perda de seus pais. Desde muito Cecília teria intimidade com a morte e saberia como ninguém as relações entre o efêmero e a etermidade. A infância daria a ela duas coisas que parecem ruins: o silêncio e a solidão. E foi justamente nessa área, segundo ela, que os livros se abriram e deixaram sair suas realidades e sonhos.




Surdina

Quem toca piano sob a chuva,
na tarde turva e despovoada?
De que antiga, límpida música
Recebo a lembrança apagada?

Minha vida, numa poltrona
jaz, diante da janela aberta.
Vejo árvores, nuvens, - e a longa
rota do tempo, descoberta.

Entre os meus olhos descansados
e os meus descansados ouvidos,
alguém colhe com dedos calmos
ramos de som, descoloridos.

A chuva interfere na música.
Tocam tão longe! O turvo dia
mistura piano, árvore, nuvens,
séculos de melancolia...

Cecília Meireles


Na solidão silenciosa, a menina Cecília encontrava suas respostas na palavra escrita. Muito antes de saber escrever, compunha versos, ainda que não fizesse poesia. Naquele momento, seus versos eram sementes que a eternidade se encarregaria de cultivar.



Por mais que procure antes de tudo ser feito,
eu era amor. Só isso encontro.
Caminho, navego, vôo,
- sempre amor.
Rio desviado, seta exilada, onda soprada ao contrário
- mas sempre o mesmo resultado: direção e êxtase.

Cecília Meireles

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