"Só se vive uma vez. E da maneira que eu vivo, uma vez basta."

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Francis Albert Sinatra nasceu raquítico, tímido, tendo como poucos companheiros uns meninos de rua tão sem esperança quanto ele, chegou a acreditar que se transformaria num marginal e morreria cedo, crivado de balas. Morreu de ataque cardíaco depois de uma longa e fascinante vida, com todos os seus percalços.

Sinatra gravou de tudo, até música de discoteca. Fez filmes bons e ruins, arrasou os corações adolescentes, foi feliz e infeliz em seus casamentos, naufragou na bebida, desapareceu num período de decadência, ressuscitou e voltou ao trono, mas tudo isso, em graus variados de intensidade e valor, ocorreu também com outros artistas. Conquistou seu espaço com talento e muque (aos 20 anos, deu na cara de um anônimo freguês do Onyx, um boteco de Nova York onde cantava, porque o homem falava alto demais). Mas outros também fizeram isso e não se transformaram em Frank Sinatra. Algo o distinguia dos artistas comuns.

Aqueles olhos azuis, aquela voz de barítono e pronúncia cristalina eram para durar para sempre. Pouco se lhes dava se seu ídolo tivesse ficado gordo ou careca; eles também haviam ficado. Tampouco se incomodaram com o fato de Sinatra ter deixado de ser o falso liberal da corte de John Kennedy, na versão americana da esquerda festiva, para aliar-se a Richard Nixon e Ronald Reagan e outros mamutes republicanos: muitos deles também fizeram isso.
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"Sinatra tinha talento demais e caráter nenhum. Por isso espalha no ar essa espécie de eletricidade que excita todo mundo" disse certa vez o excelente Billy Wilder.


/Em 1939, aos 24 anos, Frank se casou com Nancy Barbato, uma namoradinha de infância e teve três filhos.
Em 1940, juntou-se à orquestra de Tommy Dorsey, popularíssima, e ficou famoso. Dorsey, descrito por seus músicos como um tipo intratável, solitário e sovina, encostou o seu crooner na parede e cobrou-lhe 33% do que havia ganho nos dois anos de parceria. Sinatra fingiu concordar, mas Willie Moretti, um gângster sifilítico que foi amigo do cantor até morrer, em 1950, anulou o acordo enfiando um cano de revólver na boca do maestro. Terminado o serviço, enfiou uma nota de 1 dólar no bolso de Dorsey.
Apesar de ser exaustivamente investigado, jamais ficou provado seu envolvimento com a máfia, muito embora, Lucky Luciano, nas suas memórias,
diga com todas as letras: "Demos dinheiro a ele e ajudamos a transformá-lo num grande astro."

Sinatra era louco pelo poder, tinha momentos de cólera absoluta, o que fazia com que seus rompantes de generosidade atingissem a mesma magnitude. Reza a lenda que certa vez Sinatra interrompeu a farra num hotel de Los Angeles e foi ao hospital onde o ator Lee J. Cobb agonizava depois de um ataque cardíaco. Pagou a conta e desapareceu. Em outra ocasião, bancou as operações cardíacas do ex-campeão mundial de peso pesado Joe Louis, feitas pelo cirurgião Michael DeBakey, o mesmo que atuou como observador do presidente russo Boris Ieltsin operou.

Fez mais de sessenta filmes, entre eles belos musicais, como Marujos do Amor, ao lado de Gene Kelly, Alta Sociedade, com Grace Kelly, e Eles e Elas, com Marlon Brando, além de um papel dramático que lhe valeu um Oscar de ator coadjuvante em 1953, em A Um Passo da Eternidade, que o salvou do ostracismo. Naquela época, ele vivia bêbado e deprimido por causa de seu casamento com Ava Gardner, chamada pelo escritor e cineasta francês Jean Cocteau de "o mais belo animal do mundo". Ela provocou o aborto de um filho que teriam, traiu-o com vários homens e quase o levou ao suicídio.

Sinatra foi o melhor cantor popular de todos os tempos porque era o mais sensível, o mais romântico e até o mais inteligente. Vários motivos contribuíram para a criação do mito. Antes de qualquer um deles, porém, está o jeito único de cantar. O charme do Sinatra cantor sempre existiu. O passar dos anos só ajudou a lapidá-lo.

O envolvimento com músicos de jazz também ajudou Sinatra a definir sua cadência. Ele aprendeu a importância de destacar a voz do resto dos instrumentos. Não fazia isso cantando mais alto, mas sim reforçando trechos vocais nos momentos em que a banda soava menos intensa. Atacava no instante em que o acompanhamento recuava, deixando sua voz soar onipresente. Sua maneira natural de encontrar o tempo certo de cada canção acabaria influenciando todos os cantores que o seguiram.

Ele soube interpretar baladas como ninguém e deu à música popular deste século vários de seus melhores momentos. Basta lembrar de My Way, Let Me Try Again, New York, New York e tantas outras canções que embalaram as lembranças mais felizes, ou até mesmo infelizes, de milhões de homens e mulheres ao redor do mundo. Old Blue Eyes faz muita falta por aqui.
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"Chega desse papo de 'tragédia da fama'. A tragédia da fama é quando ninguém aparece e você está cantando para a faxineira num botequim vazio que não recebe um cliente pagante desde o dia de São Nunca."


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