Quase duas horas de espera. Era dezembro e a noite estava gelada. Ele não apareceu. Na verdade, eles jamais iriam se conhecer. Naquele dia os astros desaconselhavam tal encontro, diriam depois no meio literário.
Pela descortesia, ela recebeu dele um livro, era Mensagem e trazia a seguinte dedicatória:


A Cecília Meireles, alto poeta, e a Correia Dias,
artista, velho amigo e até cúmplice (vide "Águia" etc....),
na invocação de Apolo e de Atena,
Fernando Pessoa
10-XII-34.



Em outubro de 1934, Cecília Meireles estava em Lisboa com seu primeiro marido, Fernando Correia Dias, em missão jornalística, ela como cronista, o marido como ilustrador. Cecília era uma jovem e promissora poeta e Fernando já absorvia os frutos da publicação de seu livro Mensagem.
O casal ficou 60 dias por lá e nesse tempo, ela não conseguiu conhecer o poeta de quem seria a grande divulgadora no Brasil: Fernando Pessoa.


Há quem veja na obra de Cecília alguma influência de Pessoa e sobre isso, a poeta falou certa vez, em entrevista:


"Eu creio bem que intimamente nos pareçamos, como se parecem as pessoas de origem comum. Não só descendemos ambos de açorianos, o que é uma psicologia especialíssima, como tivemos ambos grandes mergulhos na literatura inglesa. Ele até escreveu em inglês. E esses mergulhos já vinham, a meu ver, tanto nele como em mim, por uma necessidade que se poderia chamar talvez de 'insular' - um sentido de separação, de ausência, de mar em redor... E por todos esses motivos, você sabe que os açorianos, os irlandeses, os celtas são criaturas tão de sonho que estar acordado já é um grande sacrifício... Tanto ele como eu nos aproximamos de investigações místicas e mágicas do mundo. Ele chegou mesmo a ser astrólogo de renome, segundo ouvi dizer. Eu, apenas fiquei pasmada diante das feitiçarias do mundo."


E como disse o sábio Vinicius de Moraes: "a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida". E nesse caso, o desencontro entrou para a história.

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